Por
Dra. Angélika Sharom
Medica veterinária
A palavra estresse é usada por muitas pessoas, porém seu verdadeiro significado, suas causas e efeitos, poucos realmente conhecem. O intuito deste artigo é trazer a luz, o conhecimento básico sobre a fisiologia do estresse, quando e por que aparece em nossas aves, como reduzi-lo e aumentar o bem estar das aves de gaiola para que elas possam expressar todo potencial produtivo inerente a espécie, expressão genética (cores, tamanho e padrão da raça) e saúde.
Antes de iniciar uma criação ou mesmo ao se adquirir uma única ave de gaiola, devemos ter o conhecimento básico sobre a biologia da espécie, comportamento, alimentação, tipo e tamanho de gaiola, número de aves por gaiola, tipo de bebedouro e comedouros, local onde será colocada a gaiola, luminosidade, temperatura, umidade e principalmente objetivo da criação (reprodução, manutenção, campeonatos).
O estresse das aves está diretamente envolvido com a falha de alguns dos itens citado. O estresse crônico (falhas de manejo, ...) é tão ou mais prejudicial quando o estresse agudo (estímulo novo, como por exemplo, mudança de ambiente, sons e ruídos, ...).
Estresse é um estado sistêmico que se desenvolve como resultado da aplicação prolongada de estressantes. Os estressantes são fatores ambientais que estimulam respostas homeostáticas, fisiológicas e comportamentais além do normal. A única medida aceitável da presença ou ausência de estresse é o nível sanguíneo de CORTICOSTEROIDE.
A homeostasia é um FENÔMENO ADAPTATIVO, uma resposta cumulativa da INTERAÇÃO do animal com o Meio Ambiente. Mantendo o meio interno do organismo em equilíbrio com o meio externo, através de uma série de sistemas funcionais de controle, envolvendo mecanismos fisiológicos e reações comportamentais, mantendo estável, por exemplo, temperatura corporal, balanço hídrico, interações sociais... O bem-estar é prejudicado quando o animal não consegue manter a HOMEOSTASIA ou quando consegue fazê-la a custa de muito esforço, resultando o ESTRESSE.
Os sistemas corpóreos envolvidos no processo de adaptação ao ambiente são o endócrino, para resposta de longa duração - liberação de corticosteroides. O nervoso para estímulos sensoriais (sons, dor, calor...) com resposta de curta duração - liberação de adrenalina.
Agentes estressantes somáticos:
- Sons, imagens, odores estranhos;
- Toque;
- Mudança na posição da gaiola, troca de gaiola;
- Calor e frio;
- Efeito de drogas e agentes químicos.
Efeito da elevação de corticosteroides nas aves:
- Estimula neoglicogênese;
- Aumenta glicose sanguínea;
- Facilita lipólise;
- Facilita excreção hídrica;
- Bloqueia resposta inflamatória;
- Suprime sistema imunitário;
- Estimula secreção de ácidos gástricos (gastrites).
Os três primeiros itens provocam EMAGRECIMENTO - PEITO-SECO. Os demais itens predispõem as aves a adquirirem doenças infecciosas como: Micoplasmose, Coccidiose, Verminose, Fungo de Unha, Bouba... Por isso não exite remédio para peito-seco e sim eliminar as possíveis causas do peito-seco, isso inclui estresse.
Efeito da liberação de adrenalina nas aves:
- Hipoglicemia;
- Frequência cardíaca aumentada;
- Glicogênolise;
- Lipólise.
As consequências são as mesmas; a diferença é INTENSIDADE DO DANO, já que o mecanismo de redução da liberação de adrenalina são rápidos, os mecanismos de redução da liberação do corticosteroides nem sempre são eficientes e a consequência maior é permanência de CORTICOSTEROIDE ENDÓGENO CIRCULANTE por muito mais tempo, prejudicando o organismo como um todo. Sabe-se que aves silvestres e frangos possuem hipertrofia da glândula adrenal (libera corticosteroide).
Causas do estresse
Para aves, um ambiente satisfatório é o que oferece conforto térmico, físico, controle de doenças (limpeza e desinfecção) e satisfação comportamental (tomar banho, pegar sol, reproduzir). Um ambiente inadequado para esses fatores conduz ao estresse.
Influências ambientas que iniciam respostas fisiológicas, podendo ser classificadas como estressantes:
- Transporte: por período prolongado, especialmente sem a devida acomodação.
- Clima: especialmente temperatura, calor ou frio excessivo.
- Esforço físico excessivo: aves que se debatem demais.
- Dor: poleiro inadequado com farpas, quedas de gaiolas, brigas, dores abdominais decorrentes de superdosagem de medicamentos químicos, sintoma pouco observável, mas detectável.
- Aglomeração: excesso de aves em voadeiras ou gaiolas muito pequenas.
- Alojamento: em grandes campeonatos deve ser exigidos dos organizadores, equilíbrio entre espaço físico, número de aves e temperatura ambiente.
- Deficiência nutricional: farinhadas desbalanceadas e falta de água.
- Tranquilidade x Excitação: a grande maioria dos pássaros são criados para exposições. O molestamento constante pelo criador (ver anilha, sexo, plumagem e constituição corpórea) são, suficientes para causar medo e estresse.
- Instinto de bando: aves solitárias sempre são estressadas.
Outros fatores possíveis de estresse:
- Desmame precoce;
- Pareamento de casais incompatíveis (é normal uma fêmea aceitar o macho que designamos para ela, trocar é mais saudável);
- Uso prolongado de medicamentos químicos como: sulfas, enrofloxacinas, amoxacilinas, pomadas a base corticóide (ler a composição químicaé mais sábio que ir aplicando o que os "outros" aplicam), lembres-se a ave não reclama, por que se reclamasse...
- Evitar outros animais no ambiente das aves principalmente cães, felinos, baratas (fazer controle), ratos, insetos, parece bobo esses alertas mas, já vi "criadores" criando pássaros e ratos e não sabia por que os canários dele não reproduziam.
Soluções para melhorar o bem estar
As pesquisas em bem-estar de aves estão evoluindo, aqui citaremos algumasa correções que melhoraram significativamente a vida de nossas aves, porém um criador observador poderá criar outras opções, estamos sempre evoluindo.
- Selecionar sementes e buscar farinhadas idôneas com níveis adequados de proteína, farinhadas baratas tem como base ingredientes de última linha.
- Pegar a ave o mínimo possível, anotar todos os dados em planilha, sexo, anilha, cor, etc.
- Medicamentos preventivos deve ser bem orientados por especialistas em aves, o uso inadequado ou em dosagem errada é causa de estresse.
- O criadouro deve ser bem planejado, com boa iluminação, controle de temperatura no inverno e verão, telas contra insetos e roedores.
- Transporte, manter a gaiola tapada com pano de algodão deixando uma entrada para ar, assim as aves não veem os quatros lados reduzindo a ansiedade. Melhor seria caixas, porém para grandes criadores muitas vezes não é possível.
- Adquirir aves de criadores que respeitam a ave como ser vivo; essa ave ao ser comprada reproduzirá com facilidade na sua casa, pois é comum o criador se queixar de comprar aves caras e ao chegar no criatório elas não se aprontarem.
O quadro a seguir mostra o índice de mortalidade do conhecido "Negrito da Bolívia", ave criada para uso em hibridização com canários.
SITUAÇÃO | CAUSA | % MORTES |
Transporte | Superpopulação | 50% |
Comércio | Fortes medicações | 80% - 90% |
Criadores | Falta de higiene e manejo | 96% - 98% |
Observem que a superpopulação, fortes medicações, falta de manejo, como já foram citados anteriormente, são também causas do estresse. Podemos afirmar com esses dados que o ESTRESSE MATA 98% das aves. Muitas doenças dos nossos pássaros são na verdade frutos do estresse crônico.
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Fonte: Revista Brasil Ornitológico - Ano XXII - nº 89 - Nov-Dez/12 e janeiro 2013. Pag. 41 e 42.
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